Jessé Souza volta à UFRN e discute crise da esquerda no lançamento de seu novo livro

Publicado em 27 de novembro de 2025 às 13h29min

Tag(s): Entrevista Na Trilha da Democracia



A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) recebe, no próximo dia 3 de dezembro, mais uma edição do projeto Na Trilha da Democracia, promovido pelo ADURN-Sindicato, que chega ao seu 14º encontro trazendo o sociólogo e escritor Jessé Souza. Ele volta a Natal para lançar seu novo livro, “Por que a esquerda morreu?”, obra em que pretende interpretar a crise contemporânea das forças progressistas no Brasil e no mundo.

O evento é gratuito e aberto ao público, e acontece às 19h, no Auditório Otto de Brito Guerra, na Reitoria da UFRN. A atividade é uma realização do ADURN-Sindicato, em parceria com a Editora Civilização Brasileira e a Livraria Cooperativa Cultural.

Nesta nova obra, Jessé Souza sustenta que o enfraquecimento da esquerda não é resultado de desgaste doutrinário, mas consequência de transformações que remodelaram o pacto social nas últimas décadas. Para ele, existe hoje um descompasso entre o discurso progressista e as novas sensibilidades que surgiram na sociedade.

Em entrevista ao Jornal da Educação, o autor explicou o que o motivou a escrever o livro neste momento político. Segundo ele, apesar de acreditar na força eleitoral do presidente Lula para 2026, o cenário fora dessa figura é preocupante:  “O contexto é, exceto a figura de Lula, desolador na esquerda. Eu falo isso pois fiz várias pesquisas empíricas com os mais pobres. A narrativa do partido não chega às pessoas mais pobres, então isso eu acho muito preocupante. [...] A extrema direita, ela tem uma narrativa para explicar para as pessoas [o mundo]. É manipulação da vulnerabilidade alheia, mas ela dá um sentido ao mundo. E a esquerda não consegue montar isso.”

No livro, Jessé argumenta que a esquerda tem falhado em construir um discurso capaz de disputar o imaginário popular. Para ele, a extrema direita ocupa esse espaço ao oferecer uma narrativa que “dá sentido ao mundo”. Ele afirma que, sem uma história clara sobre o país e seus conflitos, o campo progressista fica enfraquecido.

Jessé também discute transformações globais que ajudam a explicar o colapso da esquerda contemporânea. Entre elas, o movimento dos super-ricos, nos anos 1970, para reagir aos avanços sociais, culturais e políticos impulsionados pela juventude das décadas anteriores: “Os motivos para o colapso da esquerda são vários. Mas, o principal tem a ver com a reação dos super-ricos a partir de 1970 contra um mundo que estava sendo transformado e revolucionado pelas gerações jovens dos anos 1960 e 70, baseado em liberdade, autonomia, criatividade, etc. Como os novos valores, não apenas a coisa produtivista - do ser humano visto como abelha, que vai trabalhar e retirar a sua dignidade disso -, mas também de que todo ser humano tem o direito de descobrir e escolher quem ele quer ser. Ou seja, isso é pós-produtivismo. Isso vai gerar feminismo, isso vai gerar a luta pelo direito civil, isso vai gerar a luta contra a guerra do Vietnã, que vai empoderar a guerra Anti-imperialista, isso vai conceber a natureza de uma outra maneira, de uma maneira não instrumental, exatamente porque é pós-produtivista, etc".

Segundo ele, esses novos valores trazidos por essas gerações foram reinterpretados pelo capitalismo, que passou a utilizá-los para reforçar novas formas de exploração.

Jessé destaca ainda o papel das redes sociais na fragmentação do debate público: "Na esfera pública você tem muito importante o advento das redes sociais. São redes privadas americanas que trabalham com o departamento de Estado, que esteve por trás de mil golpes de Estado: a Primavera Árabe, Brasil 2013, e por aí vai. Você tem aí uma uma formação de bolhas autorreferidas, que não se referem mais a nenhum pano de fundo comum, então não há diálogo. Se não há diálogo, não há aprendizado possível na esfera pública. 

Isso tudo foi causado pelo intuito de lucro a qualquer custo dessas redes e isso complica a situação da esquerda. A esquerda [...] precisa produzir um imaginário social próprio. Ela precisa denunciar o imaginário social dominante, que é o que causa a opressão e aceitação da inferioridade pelas classes que são oprimidas, e montar uma nova história. É exatamente isso que é necessário agora, por mais difícil que isso seja e por mais duras sejam agora os pontos de partida."

A entrevista também abordou o retorno de Jessé Souza à sua cidade natal. A última participação dele no Na Trilha da Democracia ocorreu há quase uma década. O sociólogo destaca a dimensão afetiva desse reencontro com Natal e com a UFRN. “ Para mim, obviamente, é sempre algo muito emocional quando eu volto a Natal. Natal é a cidade onde eu nasci e vivi até 17 anos. Toda a minha infância, toda minha adolescência. Eu tenho muitos amigos ainda dessa época. É, enfim, o meu contexto, é a minha raiz, é o meu berço. E eu sempre fiquei muito contente, sempre fui muito bem recebido pelos meus conterrâneos. Então, para mim, é muito significativo poder lançar é esse livro novamente em Natal já depois de muito tempo."

Reconhecido por títulos como A Elite do Atraso e A Radiografia do Golpe, Jessé Souza é uma das vozes mais influentes do pensamento social brasileiro. Professor, pesquisador e ex-presidente do IPEA, reúne em sua obra análise crítica, argumento sociológico e linguagem acessível.
O público poderá prestigiar a palestra, acompanhar o debate e adquirir o livro durante o evento. O Na Trilha da Democracia com Jessé Souza acontece no dia 3 de dezembro, às 19h, no Auditório Otto de Brito Guerra, na Reitoria da UFRN. A entrada é gratuita.

ADURN Sindicato
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