Tânia Bacelar: “Não há como a sociedade brasileira suportar a PEC 55”

Publicado em 17 de outubro de 2017 às 20h30min

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A emenda constitucional nº 95 (antiga PEC 55) é insustentável. Não há como a sociedade brasileira suportá-la por 20 anos. O diagnóstico foi trazido pela respeitada economista e socióloga Tânia Bacelar, que esteve no campus central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte nesta terça,17, para realização da terceira edição do Projeto Diálogos.

A professora pernambucana confrontou o pensamento econômico hegemônico no Brasil para uma plateia de mais de duas centenas de estudantes, docentes e servidores da UFRN, além de políticos e a sociedade civil organizada, que lotou o auditório do NEPSA 1, no Centro de Ciências Sociais Aplicadas.

Tânia avalia que, cedo ou tarde, amplos setores da sociedade devem iniciar os debates para derrubar a agenda que a emenda constitucional 95 propõe: manter um Estado que tira riqueza de quem não tem para financiar quem não precisa.

Segundo a economista e socióloga, se ainda não o fizeram é porque existe um debate interditado no Brasil sobre as verdadeiras causas do déficit público e de quem deve pagar a conta pelo ajuste.

Para embasar a assertiva, Tânia iniciou a exposição mostrando a diferença da cara do Brasil em duas décadas, com a melhoria do índice de desenvolvimento humano a partir das condições sociais.

Brasil: trajetória recente e crise atual

Após uma breve exibição do funcionamento da avançada globalização a nível mundial, a economista falou dos impactos da crise financeira de 2008 e seus desdobramentos no mundo.

Com a citação de Antônio Gramsci, de que “a crise consiste no fato de que o velho está morrendo, mas o novo ainda não nasceu”, Tânia fez uma síntese da conjuntura de crise em tempos de mudanças estruturais, especialmente do processo que levou o país a vivenciar o atual momento.

Com números, a respeitada economista apresentou o modelo de crescimento do início do século XXI, com elevação da renda das famílias, aumento da demanda popular por bens dos setores modernos, elevação da produtividade da competitividade e das exportações e investimentos (inclusive em inovação).

Para Tânia, neste período, a evolução do salário mínimo real, da renda nominal domiciliar per capita e do emprego formal resultaram no crescimento a taxas maiores na base da pirâmide da renda e, consequentemente, na melhoria do quadro social.

Crise atual

Além de variáveis externas, como uma economia impactada pela crise financeira, retração da China e queda mundial dos preços das commodities, Tânia Bacelar aponta como o início da crise do governo da presidenta eleita Dilma Rousseff a aposta em patrocinar a queda brusca dos juros e o rompimento político do pacto feito no governo Lula, que previa a melhoria das condições de quem estava em baixo da pirâmide sem mexer com quem está no topo.

Além disso, o arrefecimento do crescimento puxado pelo consumo das famílias, com rápido avanço da recessão (forte desemprego, queda da renda real, e altas taxas de juros reais), e o problema fiscal agravado pela desaceleração da receita e medidas que ampliaram renúncias, despesas e dívida pública, agravaram o quadro.

Para a economista, a crise econômica, social e política convergem na conjuntura brasileira. Ela falou da operação “Lava Jato”, que atinge as maiores empresas do país, afeta os investimentos, e gera forte tensão no meio político, do presidencialismo de coalizão, que chega a exaustão, e do governo Temer, que sem credibilidade na população busca realizar mudanças profundas , com destaque para cortes de despesas públicas e redução da presença do Estado.

A professora afirma que o modelo do atual governo é de privatização com desnacionalização, que atinge nossa base de recursos, como os setores de petróleo e gás, que já lidera o investimento na indústria do país e tem potencial de ampliar seu peso na dinâmica da economia nacional nas próximas décadas.

A conta de Governo, a PEC 55 e as despesas primárias

Para tratar dos cortes e do congelamento das despesas primárias previstas na emenda constitucional 95, ou seja, onde estão os gastos e investimentos sociais em saúde e educação, Tânia explicou a existência das despesas primárias e despesas financeiras.

Segundo ela, as despesas primárias são aquelas relacionadas ao pagamento de pessoal, custeio da máquina pública, transferências e investimentos. As despesas financeiras são aquelas para pagamento da dívida e dos juros da dívida pública.

Os defensores da PEC 55 diziam que a redução das despesas primárias implicaria na diminuição do déficit. Mas para a economista não é verdade. “O cerne do problema da dívida e do déficit está no tamanho dos juros praticados no Brasil. E isso fica evidente a partir de 2014, com o agravamento da crise econômica”.

Para ela, o significativo aumento dos juros é que gera o aumento da relação dívida/PIB tão criticado pelos defensores da PEC 55. “Mas, por incrível que pareça, não está no debate nacional a redução dos juros. E olhe que o Brasil é o país com o maior juro real do mundo”, ressalta Bacelar.

A falácia da relação dívida/PIB e a confiança no governo

Os defensores da PEC 55 diziam que o custo dos juros da dívida está relacionado à sua capacidade de honrar os compromissos fiscais, que quando cresce muito a relação dívida/PIB o país fica sob suspeita e que os credores não confiam e deixam de financiar o governo. Por esses fatores, os juros têm que ser altos, para tornar os títulos atrativos aos rentistas.

Mas para Tânia Bacelar isso também não é verdade. “Os países que têm relação dívida pública/PIB bem maior do que o Brasil estão pagando juros bem menores do que o nosso. O Brasil é a exceção. Nós somos um ponto fora da curva. Remuneramos o capital financeiro melhor do que qualquer país do mundo”, afirmou.

Porque a Emenda 95 é insustentável

“Não há como a sociedade brasileira suportar a PEC 55”, afirma de forma categórica. Segundo Tânia, ela exclui os gastos sociais de toda a dinâmica da economia. “Vamos tirar todo o crescimento futuro da economia para pagar as despesas financeiras. No fundo, estaremos tirando recursos dos mais pobres para pagar os bancos e as grandes empresas. Simples assim”, explica.

Homenagem

Nesta terceira edição do Projeto Diálogos, uma realização do ADURN-Sindicato e da Cooperativa Cultural da UFRN, que contou com apoio do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UFRN, a economista pernambucana Tânia Bacelar recebeu uma homenagem em vídeo e em placa.

O momento, segundo o presidente do Sindicato, Wellington Duarte, é um reconhecimento em vida à sua dedicação ao Nordeste estudando planejamentos estratégicos para o desenvolvimento dessa região.

O conteúdo da apresentação da economista e socióloga Tânia Bacelar pode ser acessado aqui.

ADURN Sindicato
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